segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Teoria e Análise: a questão do estilo


Olá pessoal!

Estou de volta para mais uma coluna sobre teoria e análise. Diferente das outras colunas deste blog nas quais eu passo estudos teóricos e práticos sobre os assuntos abordados, neste espaço busco refletir sobre os conteúdos e instigar novas pesquisas dos leitores.

Essa é a sétima coluna que eu faço nesse modelo, mais reflexivo e menos técnico. Como já falei muitas coisas por aqui, pretendo hoje discorrer sobre um ponto importante que é o estilo. Sem claro, nos atermos as definições históricas do termo, pois existe uma área de conhecimento chamada estilística que vai trazer muitas colocações importantes sobre o assunto. A nossa ideia sempre é refletir sobre alguns problemas que são discutidos no meu trabalho dentro da Universidade, mas que fora dela deve ser transmitido de maneira sucinta e prática para aplicarmos em nossos estudos musicais.

Antes de falarmos das colunas e dos tópicos, vejam essa citação do Leonard Meyer extraída do artigo de Robert Gjerdingen Meyer and Music Usage,” Musica Humana 1 (2009): 197–224.

“Estilo é uma replicação de padrões, seja no comportamento humano ou nos artefatos produzidos pelo comportamento humano, que resulta de uma série de escolhas feitas dentro algum conjunto de restrições”.

Perceberam que essa citação nos leva a refletir sobre os modelos de composição e improvisação que comentei nas colunas anteriores aqui no blog, pois se estilo é o ato de replicar padrões, então necessitamos compreender antes de mais nada quais são os padrões que são utilizados nos estilos musicais que desejamos desenvolver. 

Assim, uma música no estilo do Blues, por exemplo, requer sonoridades e padrões que tenham relações com este estilo. Assim, vamos fazer um exercício de imaginação:

- Pense em uma música que você quer escrever como um Blues, mas utiliza riffs com padrões extraídos de uma banda de Trash Metal. Como vai soar?

Aí você pergunta: - eu não posso fazer isso?

-Claro que pode, mas com certeza o seu Blues não saíra com "cara" de Blues, ele no mínimo será algo bem híbrido.

Em suma, o que quero dizer é que você pode fazer o que quiser, mas tem que estar ciente das sonoridades que vão sair conforme as escolhas ferramentais que você tiver. 

A liberdade de um artista é essa, deformar tais padrões, mas se você quiser mostrar domínio sobre algo, precisa saber qual é a ferramenta mais adequada para chegar em tal som.

Portanto, compreenda os padrões harmônicos, rítmicos e melódicos que ocorrem nos estilos que você mais gosta ou que quer trabalhar. Estude-os exaustivamente. Mas não se esqueça, que um grande artista sempre expande os seus conhecimentos.

Nas composições que faço para o Apostrophe' procuro trabalhar essa ideia bem livre, pois para mim as amarras estilísticas existem, mas servem para eu deixar os trechos com a sonoridade mais próxima do que eu procuro. Por exemplo, escute a música Thaís e a Festa do primeiro álbum do Trio.



Essa música originalmente era um choro, mas transformei em um samba com o passar do tempo. Para ser um choro mais puro, precisaria mudar algumas ideias harmônicas e formais, para condizer com o estilo. Como samba ela ganhou outras possibilidades de fraseado. Na sequência eu coloquei uma frase em 5/8 que extraí de uma ideia para uma música mais voltada para o Metal Progressivo. Na sequência coloquei esta frase em cima de uma progressão harmônica utilizada pelo King Crimson. Por fim, de forma instintiva escolhi os lugares que essa frase entraria para quebrar o samba. Não preciso nem colocar a minutagem em que cada ideia ocorre dentro da música, vocês perceberão quando escutar qual parte destas que descrevi.

Viram, como artista posso fazer o que eu quiser, qual é a consequência, eu não consigo dizer que essa música é um choro ou um Metal, pq ela é muito híbrida para qualquer estilo. Mas, no final das contas a música é minha e eu a monto do jeito que ela aparece na minha cabeça. 

É isso aí!

Estas aulas são parte de um acervo produzido pelo autor e que estão relacionadas as suas pesquisas sobre contrabaixo, análise e teoria musical.

Para maiores informações entre em contato pelo e-mail: femtavares@gmail.com

Espero ter contribuído com mais algumas reflexões para o seu estudo. 

Abraços e até a próxima coluna!

Fernando Tavares é pesquisador, professor e contrabaixista. Contribuiu com diversas publicações para revistas especializadas em contrabaixo e hoje é membro do LAMUS (Laboratório de Musicologia da EACH-USP Leste), do CEMUPE (Centro de Musicologia de Penedo) e do LEDEP (Laboratório de Educação e Desenvolvimento Psicológico da EACH-USP Leste).

É Mestre e Doutorando em Musicologia pela ECA-USP e é bolsista da CAPES.

"O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001

"This study was financed in part by the Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Finance Code 001"

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